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O equilíbrio econômico-financeiro nos Contratos Administrativos

Por Magnus Guimarães - Coordenador da área de Direito Administrativo | 10/10/2022

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O equilíbrio econômico-financeiro nos Contratos Administrativos

Por Magnus Guimarães - Coordenador da área de Direito Administrativo | 10/10/2022

A crise gerada pela COVID-19, doença causada pelo coronavírus, e posteriormente a recente guerra na Ucrânia tiveram reflexos diretos na oscilação de preços dos commodities.

Por isso, no mundo todo, inclusive no Brasil, houve um aumento vertiginoso, sem precedentes, dos custos de materiais e insumos de vários segmentos (saúde, alimentação, informática etc.) mas, especialmente, no campo das obras de construção civil.

O comportamento instável nos custos dos insumos da construção vem desde o ano de 2020. O aço ficou 47% mais caro. Materiais de PVC subiram 42%, o cimento teve crescimento de 40% nos custos, e os cabos de cobre encareceram absurdamente.

Esses fatos causaram muita instabilidade e preocupação às empresas da área de construção civil, mas, de modo particular, nas que celebraram contratos com o Poder Público, pois, não era possível prever, à época da elaboração das propostas, que surgiriam aumentos de preços sem precedentes na economia.

Sobre o tema, Gabriela Verona Pércio, professora e palestrante CEO na GVP Parcerias Governamentais, observou com muita didática que “em um cenário de normalidade, ainda, é possível realizar a gestão de riscos, contemplando certos eventos entre aqueles merecedores de tratamento, e calibrar, se for o caso, a responsabilidade das partes pelos riscos econômico-financeiros do negócio. Contudo, nas circunstâncias da pandemia da Covid-19, aumentarão as chances de descumprimento contratual e as dificuldades de realizar a gestão de riscos em razão da falta de alternativas consideradas eficazes ou da natureza heterodoxa das alternativas identificadas.” (in, Descumprimento de Contrato Administrativo e Aplicação de Sanções no Contexto da Pandemia do Covid-19 – Portal L & C).

Sabe-se que um dos mais caros princípios que informam as contratações da Administração Pública, é o da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, que visa à manutenção de reciprocidade e proporcionalidade entre as obrigações daquele que contrata com o ente público e a retribuição a que este se obriga.

Cumpre assinalar que a questão da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro nos contratos administrativos correlaciona-se com o dever da Administração Pública na preservação das condições da proposta por ela aceita em razão do contrato, conforme estabelece o art. 37, XXI, da CF, cujo comando assegura “cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei.”

De fato, o equilíbrio econômico-financeiro representa sim, garantia ao contratado, mas por isso e na mesma medida, proteção ao interesse público e à Administração.

Nesse passo, o equilíbrio econômico-financeiro está obrigado, ainda, por outro dispositivo constitucional: o art. 5º, XXXVI, segundo o qual “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. A equação econômico-financeira contratual é um direito adquirido do contratado, de tal sorte que normas a ele sucessivas não poderiam afetá-lo.”

A alínea “d” do inciso II e os §§ 5º e 6º da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 (que será revogada em 01/04/23), dispõe, in verbis:

 

“Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

[...]

II - por acordo das partes:

[...]

d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.

[...]

5º Quaisquer tributos ou encargos legais criados, alterados ou extintos, bem como a superveniência de disposições legais, quando ocorridas após a data da apresentação da proposta, de comprovada repercussão nos preços contratados, implicarão a revisão destes para mais ou para menos, conforme o caso.

6º Em havendo alteração unilateral do contrato que aumente os encargos do contratado, a Administração deverá restabelecer, por aditamento, o equilíbrio econômico-financeiro inicial.”

 

Oportuno registrar ainda que a AGU – Advocacia Geral da União, tendo em vista o disposto no art. 37, XXI, da CF e no art. 65, II, “d”, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, expediu a seguinte Orientação Normativa nº 22/2009, que garante a concessão do reequilíbrio econômico-financeiro, independentemente de previsão contratual.

Por sua vez, o inciso VI do art. 81 da Lei Federal nº 13.303, de 30 de junho de 2016 (Regime Licitatório e Contratual das Empresas Estatais), também assegurou o instituto:

 

“Art. 81. Os contratos celebrados nos regimes previstos nos incisos I a V do art. 43 contarão com cláusula que estabeleça a possibilidade de alteração, por acordo entre as partes, nos seguintes casos: (Vide Lei nº 14.002, de 2020)

[...]

VI - para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.”

 

E a Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021 (Nova Lei de Licitações), também fez previsão objetiva da matéria:

 

“Art. 124. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

[...]

d) para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato.”

 

Desse modo, havendo a alteração legal (redução ou elevação) de alíquotas de tributos  ou a modificação (redução ou elevação) dos encargos trabalhistas produzidas por convenções e dissídios coletivos (negociações coletivas envolvam a ampliação dos encargos atribuídos aos empregadores) e outros fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, implicando a revisão destes para mais ou para menos, conforme o caso, é imperiosa a revisão.

Assim, conclui-se, com uma clarividência solar, que é obrigação da Administração manter na íntegra a equação econômico-financeira inicial do contrato administrativo.

Vale enaltecer que se trata de garantia fixada pela própria Constituição, que não permite a lei ou a decisão judicial de qualquer tribunal retirá-la.

Portanto, se o Poder Público contratante não deferir o requerimento administrativo de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, a empresa contratada deve seguir o caminho do Judiciário, pleiteando a concessão de reequilíbrio econômico-financeiro e a respectiva indenização.

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Lacerda Diniz Sena
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